Como funciona o SHM (Structural Health Monitoring)?
SHM e sua analogia com o Sistema Nervoso Humano
O processo de SHM (Structural Health Monitoring), ou Monitoramento da Saúde Estrutural, envolve a implementação de ferramentas e estratégias de caracterização e detecção de danos em estruturas e equipamentos de engenharia, sendo aplicado nos mais diferentes setores (Energia, Construção Civil, Mineração, Ferrovia etc). Para entender melhor os fundamentos de SHM que se relacionam com a indústria 4.0 confira o artigo: SHM (Structural Health Monitoring) na indústria 4.0.
O SHM apresenta uma constituição semelhante à do sistema nervoso humano, que é replicada em estruturas e equipamentos de engenharia, sendo esses últimos estacionários ou móveis. Desta forma, a implantação com êxito se assemelha a um sistema sensorial interconectado que alimenta um centro de processamento de informações. Em analogia ao organismo humano, o sistema sensorial do corpo composto por receptores e nervos, são representados pelos sensores e redes de fio em um equipamento complexo, por exemplo um avião. Toda a informação capturada pelos sensores e conduzida por nervos aferentes será encaminhada ao cérebro onde será conectada e interpretada, no caso do corpo humano. No SHM não é diferente, uma vez que apresenta, também, uma central desenvolvida para processamento de informações.
Basicamente, o SHM visa conhecer as condições e possíveis danos aos elementos críticos de uma estrutura, ou equipamento, definidos de acordo com objetivos, normas e requisitos. Suas ferramentas são capazes de coletar e processar os dados reais de operação do ativo, alimentando o processo de análise estrutural e permitindo a tomada de decisão com maior confiabilidade, precisão e agilidade. O sistema se faz extremamente útil no gerenciamento de ativos e recursos para sua manutenção, além de proporcionar um diagnóstico preciso das anomalias identificadas.
O SHM também auxilia na tomada de decisões para garantir a integridade da estrutura, em conjunto com profissionais capacitados, no momento certo, de maneira proativa e não reativa. Quando bem implementado, um sistema de SHM permite correlacionar a fadiga obtida no cálculo teórico com o consumo de vida útil real da operação do equipamento. Portanto, a vida útil restante será monitorada diretamente dos componentes instrumentados sem necessidade de se realizar novos cálculos.
O monitoramento estrutural está intimamente ligado à segurança. De fato, a detecção precoce de comportamentos anormais mitiga o risco de colapso repentino. Essa detecção contribui para a preservação de vidas humanas e bens materiais. Além disso, os dados gerados pelo SHM auxiliam e apoiam a tomada de decisões a nível operacional e/ou gerencial. Complementarmente, o monitoramento estrutural por SHM fornece eficiência no planejamento de manutenção devido à análise do consumo de vida útil dos componentes da estrutura ou do equipamento. Assim, contribui para o prolongamento da vida útil da estrutura, minimizando os custos diretos de manutenção e as perdas de manutenção.
O SHM tem como objetivo determinar, a todo momento durante a vida útil do ativo, um diagnóstico dos componentes estruturais ou, quando possível, da estrutura como um todo. Mesmo com projetos auditados e bem elaborados, devido às condições de uso do ativo, ação ambiental e eventos acidentais, a estrutura pode sofrer uma ruptura respeitando os critérios de projeto. O monitoramento é capaz de levar em consideração esses critérios associados à dimensão do tempo, tendo caráter prognóstico complementar.
Desde a década de 1940, alguns relatórios podem ser encontrados sobre o uso dessa técnica. Nos últimos anos, devido à crescente evangelização sobre seus benefícios e concomitante redução nos custos de hardware e software, a tecnologia tem sido mais utilizada, seguindo as crescentes preocupações da comunidade técnica e científica em relação ao desempenho estrutural em termos de segurança, uso e durabilidade, conforme ilustra a Figura 2.
Na figura 3 abaixo, segue um esquema em alto nível de um SHM implantado nas superfícies de uma estrutura simples. Esse sistema envolve a integração de sensores (células de carga, acelerômetros etc.), processamento e transmissão de dados, permitindo o gerenciamento da estrutura no escopo individual de seus componentes e de todo o conjunto.
Um sistema típico de SHM abrange os seguintes aspectos:
- O tipo de fenômeno físico, intimamente relacionado ao dano, monitorado pelos sensores;
- O tipo de fenômeno físico usado pelos sensores para produzir um sinal (geralmente elétrico), a ser enviado para o sistema de aquisição e armazenamento de dados. Sensores de mesmo tipo de sinal, constituem uma rede e podem ser processados e ter seus dados combinados com sensores de outros tipos.
Paralelamente, outros sensores monitoram as condições do meio, sendo possível realizar a função de monitoramento. O sinal entregue pelo sistema de monitoramento de integridade, associado aos dados históricos previamente registrados, é usado para criar um diagnóstico. Cruzando essas informações, além dos conhecimentos relacionados à integridade estrutural, é possível criar um prognóstico (vida residual) e o gerenciamento de integridade da estrutura (organização da manutenção, reparos, etc.).
A criação de um sistema de monitoramento para um ativo permite a identificação e armazenamento do histórico operacional do equipamento. As sobrecargas que, por ventura, virão a ocorrer serão identificadas acima dos limites operacionais definidos e serão apresentadas para os usuários do sistema por meio de alertas visuais e/ou sonoros.
Estas informações de sobrecarga operacional são armazenadas pelo sistema, criando um banco de dados que permitirá análises com maior confiabilidade acerca da vida útil da máquina e seus componentes. Com base nesse banco de dados, análises mais avançadas, que utilizam inteligência artificial e estatística, podem ser elaboradas, resultando em um maior conhecimento do comportamento do equipamento e consequente maximização da utilização.
Além de permitir o monitoramento das variáveis operacionais do equipamento, o sistema SHM, será capaz de indicar quais componentes estruturais do equipamento devem ser objeto de inspeção, ou até mesmo se uma inspeção pode ser postergada, como é o caso de equipamentos que operam com carga muito reduzida. Em contraponto, sendo o equipamento submetido a cargas excessivas, inspeções de rotina podem ser antecipadas, haja visto o risco de nucleação de trincas nessas circunstâncias.
As inspeções em determinados componentes estruturais poderão ser priorizadas conforme o valor do dano acumulado em fadiga do componente, cujo alcance é calculado pelo sistema de monitoramento.
Por exemplo, uma lança de máquina de pátio provavelmente terá um dano acumulado superior à um carro inferior, uma vez que apresenta maior variação de cargas em um mesmo intervalo de tempo, e, portanto, estará mais sujeita à trincas por fadiga.
As situações descritas acima ilustram de forma clara como o SHM é capaz de contribuir para uma eficaz atuação do setor de Manutenção, contribuindo para o tripé de benefícios associados ao sistema – segurança, utilização e durabilidade.
Benefícios do SHM
São benefícios do sistema SHM:
1. Redução de incertezas:
- Os proprietários de equipamentos enfrentam muitas incertezas sobre o estado real dos materiais do equipamento/estrutura, sobre as cargas reais agindo, sobre a estrutura envolvida e o seu envelhecimento. No momento de tomar decisões sobre a estrutura, estas incógnitas têm que ser levadas em conta. O monitoramento ajuda a mitigar essas incertezas e, portanto, permite ao proprietário tomar decisões conforme base de dados e em menor tempo hábil;
2.Descoberta de reservas estruturais ocultas:
- Em algumas situações, muitas estruturas estão em condições muito melhores do que o esperado. Desta forma, o SHM permitirá um aumento efetivo das margens de segurança sem qualquer intervenção sobre a estrutura. Aproveitando as melhores propriedades dos materiais, efeitos sinérgicos, entre outros fatores, se faz possível prolongar, com segurança, o tempo de vida ou capacidade de uma estrutura, sem qualquer intervenção.
3.Verificação de deficiências no tempo adequado e elevação da segurança:
- Algumas estruturas apresentam deficiências que não podem ser identificadas por meio de inspeção ou modelagem. Nestes casos, é crucial empreender ações preventivas adequadas antes que seja tarde demais. Deste modo, eventuais reparos apresentarão um menor custo e causarão menor interferência na disponibilidade da estrutura, se forem feitos no momento certo;
4.Promoção da qualidade de longo prazo da estrutura e da gestão estrutural do ativo:
- Cada política de qualidade requer medições e retroalimentação para garantir que os objetivos sejam alcançados e que ações corretivas possam ser tomadas em caso de não conformidades. Ao fornecer dados contínuos e quantitativos, um sistema de monitoramento ajuda avaliar a qualidade da estrutura durante a construção, operação, manutenção e reparo, eliminando assim os custos ocultos. A maioria dos defeitos e danos a uma estrutura são incorporados durante o processo de construção. No entanto, muitos deles irão produzir um resultado perceptível somente após muitos anos, momento no qual o reparo é muito mais caro e o ativo já não é mais coberto pela garantia do contratante;
- Os dados de monitoramento podem ser usados para a realização de uma manutenção “sob demanda”. Dessa forma, custos são reduzidos por otimização da operação, da manutenção, do reparo e da substituição de estruturas com base em dados confiáveis e objetivos. Dados do SHM podem ser integrados nos sistemas de gestão estrutural para aumentar a qualidade das decisões, fornecendo informações confiáveis e imparciais.
5.Elevação do conhecimento sobre a Engenharia e o ativo:
- Aprender como uma estrutura funciona de fato, em condições reais de operação, ajudará o cliente a projetar estruturas melhores para o futuro. Cria-se assim, a possibilidade para o desenvolvimento de estruturas com menor custo, mais seguras e duráveis, com maior confiabilidade e desempenho. Um pequeno investimento no início de um projeto pode levar a economias significativas em médio e longo prazo, otimizando-o e descobrindo prontamente as “fraquezas” estruturais no tempo adequado.
6.Monitoramento contínuo:
- O funcionamento do sistema pode ocorrer 24 (vinte e quatro) horas por dia, nos 7 (sete) dias da semana, providenciando um banco de dados alimentado ininterruptamente durante o período de leitura. A quantidade de dados permite criar um histórico confiável de diversos momentos na vida do ativo, facilitando na elaboração de comparativos, previsão da manutenção, realização de análises e antecipação de ações preditivas;
7.Extensão da vida útil do ativo:
- O aumento da vida útil do ativo está diretamente relacionado aos ganhos de precisão e à quantidade de informação que o sistema SHM fornece. Os dados coletados possibilitam a realização de ações preditivas e preventivas que beneficiam a integridade a longo prazo da estrutura. Desta forma, expande-se a durabilidade do ativo com a mesma confiabilidade de projeto;
8.Redução de custos:
- A redução dos custos está correlacionada com a realização de ações para mitigar anomalias imediatamente quando estas aparecem, investindo os recursos em atividades de manutenção bem menos onerosas do que as atividades de reparo e reforço da estrutura.
Em suma, SHM é um processo que permite às empresas uma melhor gestão de seus ativos, mas que demanda tecnologias específicas, profissionais capacitados, e uma cultura empresarial alinhada com ações de predição e prescrição ao invés de medidas corretivas.
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Aender Ferreira
Técnico em Mecânica pelo CEFET-MG, Engenheiro Mecânico/Aeronáutico pela UFMG e Mestre em Engenharia Mecânica pela mesma universidade. Antes da graduação, teve experiências nos setores de mineração, manutenção, projetos mecânicos, engenharia experimental e indústria automotiva. Como engenheiro, iniciou sua carreira em uma montadora aeronáutica realizando atividades de cálculo de fadiga em componentes e estruturas aeronáuticas. Posteriormente foi convidado pelo fundador Prof. Ihor Kotchergenko a compor o corpo diretor da Kot Engenharia, onde atua há mais de 16 anos. Atualmente, Aender ocupa o cargo de CEO da empresa.
Referência:
[1] BALAGEAS, Daniel; FRITZEN, Claus-Peter; GÜEMES, Alfredo (Ed.). Structural health monitoring. John Wiley & Sons, 2010.
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