Análise mecânica de transportadores de correia: qual a sua importância? – Parte 2
Introdução
Conforme abordado anteriormente na parte 1 deste artigo (Análise mecânica de transportadores de correia: qual a sua importância? – Parte 1), transportadores de correia (TRs) são equipamentos de transporte ininterrupto de materiais, compostos por uma correia contínua que se desloca sobre roletes e tambores, auxiliando na eficiência do transporte. Esses ativos são constituídos por diversos elementos mecânicos, como os sistemas de acionamento e de esticamento.
Além dos pontos abordados na primeira parte do artigo, a análise mecânica de transportadores tem como objetivo avaliar os componentes mecânicos do sistema de acionamento e do sistema de esticamento, bem como os roletes de impacto, carga e retorno. Neste artigo serão apresentadas algumas das verificações realizadas pela Kot para esses itens.
Sistema de acionamento
O sistema de acionamento é composto pelo motor, acoplamento e redutor, podendo também conter volante de inércia, contra recuo e freio. Na maioria dos transportadores, esse sistema tem a função de prover a potência necessária para movimentação da correia. No caso de TRs com perfil regenerativo (descendentes), o acionamento opera como um gerador, controlando a velocidade da correia e transformando a energia mecânica do movimento em energia elétrica.
Para ambos os cenários o sistema de acionamento também tem a função de realizar as partidas, as paradas e a retenção da correia por meio dos freios e contra recuos. Na Figura 2 é apresentado um desenho esquemático de um sistema de acionamento convencional, com a identificação dos seus componentes principais.
A potência requerida pelo transportador também é calculada por software especializado, utilizado para análise do modelo mecânico, conforme mencionado no artigo parte 1. Para o dimensionamento e avaliação dos componentes do sistema de acionamento é fundamental conhecer a potência requerida em diferentes condições operacionais que o ativo pode trabalhar, sejam elas comuns, momentâneas ou incomuns.
Com base nas potências requeridas são avaliados os índices de utilização do motor para as diferentes condições operacionais, verificando a possibilidade de sobrecargas, que podem resultar em desarmes indesejados ou reduzir a vida útil dos componentes do sistema de acionamento. O cálculo das sobrecargas, seja na etapa de projeto, seja para o estudo de transportadores existentes, é uma informação importante a ser repassada à equipe responsável pela análise do sistema elétrico.
O Gif 1 apresenta um exemplo de avaliação da potência requerida para a condição de carregamento e descarregamento de material em um transportador de correia de longa distância (TCLD). No estudo em questão foi identificada uma sobrecarga de até 120% por cerca de 100 segundos durante o descarregamento do material. Na situação, essa sobrecarga foi informada aos responsáveis pelo dimensionamento do sistema elétrico para consideração dessa condição.
A escolha do tipo de partida dependerá das necessidades específicas do transportador, considerando fatores como inércia da carga, potência do motor e requisitos de controle. Além disso, é importante garantir que o tipo escolhido atenda aos padrões de eficiência e segurança do ativo. Os principais tipos de partida são:
- Partida Direta: É aplicada a curva de conjugado do motor elétrico (Figura 3A), que geralmente possui um valor máximo superior a 200% e uma corrente de partida seis vezes superior à nominal. Nesse caso, a partida do motor ocorre em conjunto com a partida da carga (Figura 3B) e, se a partida for longa, o motor terá uma corrente elevada por um grande período, podendo ocasionar desarmes e redução de sua vida útil. Portanto, esse tipo de partida normalmente é aplicado para TRs curtos, com baixa potência e baixa inércia da carga (tempo de partida curto).
- Por acoplamento hidrodinâmico: O acoplamento hidrodinâmico desacopla as partidas, do motor e da carga, permitindo que o motor a realize em um período curto, com uma corrente elevada. A carga irá partir após o fluido do acoplamento entrar em movimento e a potência ser transmitida entre os seus rotores. Dessa forma, é possível a ocorrência desse evento com uma sobrecarga menor. É importante realizar as análises juntamente com o fabricante do acoplamento para avaliar a temperatura do óleo durante a partida, estudo fundamental para o dimensionamento adequado do acoplamento.
- Por inversor de frequências: A partida é realizada em uma curva de velocidade em um tempo preestabelecido e ocorre de modo mais suave, conforme ilustrado na Figura 4. Nas partidas com inversor de frequência, normalmente o conjugado máximo fornecido pelo motor é de cerca de 150% do nominal.
Além do motor, também são realizadas as avaliações dos demais componentes do acionamento: redutor, acoplamentos, freios e contra recuos, quais sejam:
- Redutor de velocidades: Item responsável pela redução da velocidade do motor, sendo realizadas as avaliações da capacidade mecânica e térmica. Essa análise mecânica está relacionada à resistência mecânica dos componentes do redutor, enquanto o estudo térmico envolve a dissipação de calor. Se o redutor não estiver dimensionado da forma correta ou houver sobrecarga no sistema de acionamento, a temperatura do óleo pode exceder a máxima admissível. Assim, é possível que a viscosidade do óleo diminua, comprometendo a lubrificação e gerando um cenário propício para o desgaste excessivo dos dentes das engrenagens.
- Acoplamento e contra recuo: Os acoplamentos têm a função de transmitir potência entre componentes. O contra recuo é responsável por evitar a inversão do sentido de rotação da correia, prevenindo o retorno de material durante os momentos ociosos do transportador, principalmente nos transportadores ascendentes, que possuem maior propensão ao retorno. O estudo desses itens é realizado conforme as definições do seu fabricante, a fim de validar seu funcionamento e consolidar a segurança operacional.
Na Figura 5 é apresentado um exemplo de configuração de acionamento duplo com contra recuos em ambos os lados do acionamento.
- Freios: São avaliados o tempo de frenagem de emergência, de forma estática ou dinâmica, e o fator de segurança do torque de frenagem. Prever o comportamento da correia e as tensões atuantes nessa condição é fundamental para o dimensionamento do transportador. Além disso, destaca-se que nas análises dinâmicas de parada, de emergência ou não, muitas vezes é identificada a necessidade de incluir um volante de inércia para suavizar o comportamento dinâmico da correia e controlar os níveis das tensões máximas e mínimas.
Além das avaliações mencionadas para os freios, também são realizadas análises térmicas considerando a energia a ser dissipada durante a frenagem. Temperaturas elevadas das pinças de freio podem reduzir o seu coeficiente de atrito com o disco. Portanto, para funcionamento dos freios com segurança é fundamental que seja considerado no dimensionamento do disco e da pinça a dissipação de calor necessária.
Sistema de esticamento
Todo transportador possui um sistema de esticamento da correia, que visa adequar a tensão da correia em todo o seu comprimento. Seu funcionamento adequado é capaz de prevenir não conformidades, tais como flecha excessiva, compressão e escorregamento da correia, que prejudicam ou impossibilitam o funcionamento do equipamento. O esticamento pode ser de centro fixo (parafuso ou cilindros hidráulicos), contrapeso ou guincho (eletromecânico ou hidráulico). O esticamento de centro fixo é normalmente utilizado em transportadores curtos, enquanto os de contrapeso e guincho são mais aplicados para TRs maiores. Na Figura 6 é apresentado um desenho esquemático de esticamento por gravidade vertical.
No caso do esticamento de gravidade vertical ou horizontal, as principais verificações realizadas são dos fatores de segurança do cabo de aço e do diâmetro mínimo das polias e das roldanas do sistema. Para esticamentos por guinchos elétricos ou hidráulicos, as principais análises são da potência requerida e do torque de frenagem do guincho, além dos estudos feitos para os sistemas de gravidade.
Por fim, o curso de esticamento do transportador é verificado em função do modelo da correia, da força de esticamento, das tensões de correia do transportador em regime transiente e das necessidades de manutenções do ativo. Um curso inadequado pode causar problemas operacionais, como colisão com a estrutura e perda da força de esticamento, assim como dificultar as manutenções no transportador.
Roletes
Os roletes são responsáveis por acomodar a correia ao longo de todo o transportador, podendo ser de impacto, carga ou retorno. A quebra e o travamento constante dos rolos podem prejudicar consideravelmente a disponibilidade física do equipamento. Nesse, o dimensionamento adequado é fundamental para eficiência do ativo. Ressalta-se, ainda, que o travamento desses componentes aumenta os riscos de ocorrência de incêndios.
Em suma, são avaliadas a vida útil dos rolamentos, a deflexão do eixo na região desses rolamentos e a rotação máxima admissível, seguindo as recomendações das normas aplicáveis. O estudo da vida útil desses componentes e da rotação máxima admissível são importantes para evitar falhas constantes e prematuras dos roletes. Por outro lado, a análise de deflexão dos eixos na região dos rolamentos é importante para evitar o travamento dos rolos. Na Figura 7 é apresentado, esquematicamente, a deflexão desse eixo.
Conclusão
As avaliações dos componentes mecânicos dos sistemas de acionamento buscam avaliar a seleção e o dimensionamento do motor, redutor, acoplamentos, freios e contra recuos. O subdimensionamento desses componentes pode acarretar a redução de vida útil, manutenções não programadas e até mesmo em acidentes no ativo.
Assim como para o sistema de acionamento, o dimensionamento adequado do sistema de esticamento também é fundamental para o funcionamento e a segurança operacional dos transportadores. Além disso, roletes também são componentes cruciais para certificar-se de que o equipamento possua uma boa disponibilidade.
Tendo isso em vista, nota-se que a análise completa de transportadores de correia é de extrema importância, tanto para projetos, quanto para transportadores existentes, seja para o dimensionamento dos sistemas ou para identificar e mitigar problemas que surgem em campo. Investir na análise mecânica de transportadores de correia é crucial para que sua operação seja mais eficiente.
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